Uma nova pesquisa coordenada pelo LAB – Laboratório de Gênero e Empreendedorismo do Instituto RME, com apoio da Rede Mulher Empreendedora, revela o perfil detalhado e os desafios enfrentados por mulheres negras empreendedoras no Brasil. O estudo ouviu 715 mulheres pretas e pardas, entre os dias 14 e 18 de outubro de 2024, trazendo à tona dados importantes sobre como o racismo afeta diretamente essas profissionais.
Segundo o levantamento, 71,2% das empreendedoras pretas consideram que o racismo é mais cruel com mulheres de pele escura. Essa percepção é compartilhada por 60,8% das mulheres pardas entrevistadas.
Faturamento e escolaridade
A pesquisa aponta que a maioria das empreendedoras (47,6%) ganha até R$ 2.000 mensais. Dentro deste grupo, 44,6% são pretas e 51,5% pardas. Por outro lado, 37% conseguem faturar acima deste valor, sendo que mulheres pretas representam 42,3%, enquanto pardas são 30,5% deste grupo.
Outro dado relevante é a escolaridade das empreendedoras negras: 62,9% das pretas possuem ensino superior, enquanto este percentual é menor entre as pardas, 52,5%. A faixa etária predominante está entre 30 e 49 anos, representando 64% das entrevistadas.
Maternidade e desafios familiares
O estudo também reafirma que a maternidade é comum entre essas mulheres: 73% delas são mães. Entretanto, o número de mães solo aumentou de forma significativa. Em comparação ao estudo anterior, em que 37% se identificavam como mães solo, atualmente esse percentual cresceu para 48%. Entre as empreendedoras pretas, a proporção de mães solo chega a 50,2%, enquanto entre as pardas é de 46,9%.
Principais motivações para empreender
Entre as razões que levam mulheres negras ao empreendedorismo, a pesquisa destaca principalmente a liberdade para exercer uma atividade prazerosa. Em seguida aparecem fatores como aumento de renda, independência financeira e flexibilidade de horário. Além disso, 66,6% afirmam que coletivos e organizações sociais desempenham papel fundamental no apoio e incentivo às suas iniciativas.
Ana Fontes, empreendedora social e fundadora da RME e do IRME, destaca a importância de apoiar essas mulheres:
“A autonomia econômico-financeira é fundamental para as mulheres em geral, mas é ainda mais importante para mulheres negras que são atravessadas violentamente pelo machismo e pelo racismo da nossa sociedade. Apoiar mulheres negras nesta jornada é o trabalho da RME e deveria ser de toda a sociedade”, afirma Ana Fontes.
Acesso ao crédito e discriminação
Um dos principais desafios enfrentados pelas mulheres pretas é o acesso ao crédito. O racismo estrutural e institucional é uma barreira frequente para essas empreendedoras. O equilíbrio entre vida pessoal e profissional é outro ponto crítico destacado pelas entrevistadas pardas.
No cotidiano, a maior dificuldade citada foi a sobrecarga com trabalho doméstico e familiar, seguida da falta de crédito e das situações de discriminação racial. O estudo mostrou que 70,7% das mulheres pretas já sofreram discriminação racial em ambientes de trabalho. Esse percentual entre as mulheres pardas é de 52,8%.
Um dos depoimentos colhidos pela pesquisa revela múltiplas dificuldades enfrentadas por essas mulheres:
“No banco, passei por longo período de humilhação, e meu cadastro não foi aceito. Não tenho restrições em meu nome, pago MEI regularmente, sem atraso. Acabei desistindo de efetuar o empréstimo, meu negócio ficou parado, passei por violência doméstica por questões de abuso patrimonial, estupro marital, violência psicológica. Desenvolvi depressão e ansiedade, meus filhos também. Acabei fugindo do casamento com meus filhos no meio da pandemia com a ajuda de meus entes e outras pessoas. Ingressei no mestrado e estou retomando minha vida profissional. Racismo e machismo estrutural, institucional imperam na nossa sociedade.”
Ações e suporte para empreendedoras
A Rede Mulher Empreendedora, fundada por Ana Fontes, trabalha diretamente para melhorar as condições de trabalho e geração de renda das mulheres. Desde 2010, já impactou mais de 8,8 milhões de pessoas no Brasil. A organização oferece capacitações, mentorias, acesso ao mercado, programas de aceleração e conexões diretas entre empreendedoras e grandes empresas por meio do programa RME Conecta.
Entre os eventos promovidos estão a Mansão das Empreendedoras, o Festival RME, além de encontros mensais como Café com Empreendedoras e sessões específicas de mentoria.
O Instituto Rede Mulher Empreendedora (IRME), fundado em 2017, também desempenha papel essencial na capacitação de mulheres em situação de vulnerabilidade social. O IRME acredita que mulheres empoderadas economicamente mudam não só suas vidas, mas também suas comunidades, gerando impacto social positivo.
A pesquisa realizada pelo LAB foi executada pela Ideafix, que utilizou uma metodologia quantitativa com autopreenchimento online pelas participantes.